Uma cena inusitada chamou a atenção no duelo de ida das semifinais do Campeonato Mineiro, entre Tombense e Cruzeiro. O árbitro Paulo Zanovelli (FIFA-MG), ao achar que Marlon estava retardando a cobrança de um lateral, aplicou cartão amarelo no jogador. Marlon se indignou, e acabou expulso por reclamação logo depois.
O Cruzeiro já estava com um jogador a menos, após a justa expulsão de Zé Ivaldo. Mas o cartão vermelho a Marlon não só pareceu exagerado, como equivocado: as câmeras do jogo mostraram que quem estava pronto para cobrar o lateral que originou o primeiro cartão era, na verdade, Lucas Romero.
Revoltada, a torcida do Cruzeiro foi às redes sociais puxar o “histórico” de Paulo Zanovelli. E o que encontraram foi assustador: erros inacreditáveis nos últimos meses, como a marcação de “faltas fantasmas” em ao menos dois jogos.
A raiva dos cruzeirenses de ontem já foi a reclamação de atleticanos e americanos, num passado bem próximo. Vale citar que o América fez de tudo para que todos seus clássicos no Estadual tivessem arbitragem de fora do estado, atitude já tomada pelo Atlético anos atrás.
Ninguém confia nos árbitros mineiros. Mas eles também não se ajudam. Não há um critério, ou tomadas de decisão coerentes. Falhas graves acontecem não só no Módulo I, mas também no Futebol Feminino e nas divisões de base.
Papelão atrás de papelão
No ano passado, a árbitra Andreza Siqueira (FIFA-MG) protagonizou um “papelão” na partida entre Atlético e Bahia, pelo Brasileirão Feminino. Ela deu 8 minutos de acréscimo no segundo tempo, acresceu mais um, mas terminou o jogo com 52 minutos. Após indignação geral, ela pegou a bola e reiniciou o jogo.
Nas divisões de base – onde muitos jogos não são transmitidos – a situação é ainda pior. Juízes com muita personalidade, muita “marra”, e pouca técnica. Deixam todos a seu redor nervosos por sua falta de entendimento de um jogo de futebol, e saem aplicando cartões a quem ouse questionar uma decisão.
É claro, os jogadores não são santos. Muitos ofendem os árbitros de maneira grave e passível de punição. Mas quem apita o jogo deveria fazer um serviço melhor. É muito fácil jogar a culpa na (existente) falta de educação dos atletas, mas não fazer o seu próprio trabalho corretamente.
Um bastidor do futebol
A má qualidade da arbitragem mineira é tão séria, que os próprios clubes se preparam para lutarem contra os 11 jogadores adversários, e quem farda o uniforme amarelo.
Este redator que os escreve já realizou estágio num clube do futebol de base mineiro. Durante uma sessão de vídeo entre jogadores e comissão técnica, o treinador da equipe (nome será preservado) pediu atenção redobrada para um atacante, que caiu na área durante os treinamentos após sofrer falta.
Ele disse, claramente, para seu atacante buscar outros recursos de jogo para evitar o contato com o zagueiro. Afirmou isso criticando os árbitros que apitariam aquele Estadual Sub-20, que eram “cegos” e não só deixariam de marcar um pênalti claro, como até mesmo poderiam dar um cartão amarelo por simulação.
Há solução?
O primeiro passo para Minas Gerais construir uma base confiável de árbitros é baixar a bola. A autocrítica é necessária, reconhecer que, sim, a qualidade do apito está muito abaixo.
Sem autocrítica, nenhuma mudança é possível. Com a autocrítica, quem comanda o apito já pode pensar em melhorar tomadas de decisão, inteligência emocional, e até estudar novamente as regras do jogo. Por que não?
Nossa “reciclagem” não funciona. Um árbitro comete um erro grave, é suspenso, não aprende nada, e retorna ainda pior. Como funciona essa reciclagem, e por que ela é tão pouco efetiva?
Uma “caça às bruxas” não é justa. O diretor de arbitragem da Federação Mineira não precisa pedir demissão. Os juízes não precisam todos desistirem de suas carreiras. Mas, como diz o ditado: “O topo da inteligência é alcançar a humildade”.