Em entrevista divulgada pelo jornal O Jogo, nesta terça-feira (2), Luís Castro, ex-técnico do Botafogo, afirma que gostaria de voltar a trabalhar no Brasil
“Gostei muito e um dia talvez volte. Aliás, posso afirmar que gostaria de voltar ao Brasil. Tenho muito boas recordações de tudo. É um campeonato com uma competitividade enorme, há times campeões que descem de divisão. Nada pode ser dado como adquirido, pois a luta é até ao fim”, afirmou o técnico do Al-Nassr.
Antes disso, o treinador ainda falou sobre seu tempo no país. “Foi um percurso ondulante, como o Oceano Atlântico. Chegamos e não tínhamos nada. Não havia CT, campo para treinar e o estádio tinha condições ruins. Não havia um local para fazermos as refeições juntos, não tínhamos massagens, nem sequer marquesas. O time vinha da Série B e tinha de ser reconstruído, apesar de ter muitos jogadores e seres humanos bons. Tínhamos de refazer tudo. Encontramos também uma mentalidade muito fatalista. Após um jogo, ganhando ou perdendo, as pessoas pensavam que não iriam voltar a vencer“, acrescentou.
Em sequência, relatou o que precisou fazer para reestrutar o clube. “Em primeiro lugar, tivemos de encontrar um CT com vestiários que permitissem que todos se vestissem juntos. Depois, também foi necessário construir uma mentalidade vencedora, a parte mais difícil, dado que necessita de comunicação permanente. Fomos resolvendo problemas. Os jogadores deixaram de comer sanduíches depois do treino e criamos um refeitório, um posto médico, um auditório e outras condições, implementando uma organização que permitiu ao clube estar pronto para discutir algo no futebol brasileiro. Na primeira temporada criámos essas condições e partimos para a segunda com o objetivo de conquistar uma vaga na Libertadores”, afirmou.
“O compromisso com o grupo era simples e passava por melhorar sempre a classificação. E se estivéssemos em primeiro a ideia era aumentar a vantagem. Depois de um Carioca muito ruim, quase todo mundo pediu minha saída, curiosamente os mesmos que depois pediram para eu ficar. Mas ainda somos donos de nós mesmos. Quem bate esquece, mas quem leva nunca esquece. Não saí por isso, mas sim pela oportunidade única que tive. No futebol, não são só os clubes que podem dispensar treinadores. Às vezes também pode acontecer o contrário. A vida de um treinador não é só chegar ao estádio e a administração mandar embora”, complementou o português.
O técnico falou ainda de como o Botafogo perdeu o título, após a ida do treinador para a Arábia Saudita. “Estava convicto de que o Botafogo iria ser campeão, pela qualidade dos jogadores e pela sua dimensão humana. Eram fantásticos, mas como em tudo na vida é necessário contexto para a qualidade se manifestar. Em determinado momento esse contexto não existiu e aconteceu o que todo mundo sabe. É um time que jamais esquecerei, fundamentalmente pela forma unida como esteve nos momentos ruins, em que nos fechámos muito e evitamos que nos tocassem”, referiu.
“Sei pouco do que se passou após minha saída. Não tenho o atrevimento de tentar falar de coisas que desconheço, uma arte que muitos têm, mas eu não tenho. Há uma arte comum de tentar adivinhar o que se passa nas outras casas, no caso do futebol o que se passa nos treinos e nos vestiários, mas eu não não consigo falar sobre o que não sei. Foi com tristeza que não vi o Botafogo campeão. Depois de ver o time com 13 pontos de vantagem jamais pensei que iria claudicar. Mas não é o fim do mundo, porque o Botafogo é um clube de grande prestígio, com uma história maravilhosa e ídolos que são referências do futebol mundial. A torcida é muito emocional e adora o clube. A emoção e a forma como se expressa no estádio é muito natural. Esse comportamento nunca magoa. O que magoa é a premeditação de alguém ir a um estádio para ofender outra pessoa. Ter as arquibancadas cheias de gente, que dirige palavras menos próprias ao treinador não ofende, mas a premeditação ofende e é imperdoável“, disse também.
O treinador português mencionou ainda a paixão do Brasil pelo futebol. “O Brasil é uma paixão. Os estádios estão sempre cheios, a emoção é permanente. Os jogadores têm enorme vontade de jogar, há festa antes e depois das partidas e a mídia se envolve na competição de forma diferente. Mas há uma coisa: se não chegarmos preparados, ali derrete alcatrão! Tudo ferve e é preciso estar pronto para aguentar o embate. Há momentos violentos em termos mentais, com pressão enorme, mas quando estamos determinados pode vir a pressão toda. No Botafogo ela veio de todo lado, mas seguimos em frente e relativizámos as coisas que percebíamos”, declarou.
Por fim, agradeceu aos torcedores brasileiros. “Há momentos em que é melhor não sair de casa, mas nunca tive uma abordagem ruim na rua. Agradeço ao povo brasileiro a forma como sempre fui tratado. Senti apoio e carinho. Num estádio compreendo as emoções”, concluiu.